sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Pedrinho Gureschi

Pedrinho Arcides GuareschiEspecialista em Sociologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Mestre em Psicologia Social pela Marquette University Milwaukee, doutor em Psicologia Social pela University of Wisconsin - Madison e pós-doutor pela University of Wisconsin - Madison e pela University of Cambridge. É professor titular da PUC-RS e Consultor Internacional do Secretariado Internacional de Justiça e Paz, da Caritas Internationalis.
Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em Psicologia Social, atuando principalmente nos seguintes temas: mídia, ideologia, representações sociais, ética, comunicação e educação.

O Aparelho Ideológico das Cooperativas

O que é uma cooperativa?
A cooperativa é uma associação de pessoas que trabalham juntas pelo mesmo objetivo. É uma empresa econômica, pois reúne trabalho, capital e administração. Na parte econômica ela funciona como qualquer empresa. A diferença está na parte social, isto é, nas relações que se estabelecem entre pessoas e entre pessoas e capital.

Como funciona uma cooperativa?
Numa cooperativa, a palavra cooperação significa trabalhar junto e, se todos trabalham, todos ganham.
Todo o capital ou bens da cooperativa pertence a todos, assim como as sobras.
Os lucros ou sobras são igualmente divididos de acordo com a quantidade de quotas (ações) que cada sócio venha a possuir.
Na cooperativa as decisões são tomadas pela maioria. Cada sócio tem direito a uma voto, pois quem vale é a pessoa e não o que ela possui.

Princípios cooperativistas
Em Rochdale, Inglaterra, um grupo de pessoas foi o responsável pela experiência cooperativista. Eles criaram princípios que são seguidos até hoje (ou ao menos deveriam ser seguidos).
v   Adesão livre: entra quem quer, sai quando quer.

vGestão democrática: tudo decidido por eleição, sendo que cada pessoa vale um voto, independente de quanto capital tenha.

v  Distribuição das sobras: os lucros (sobras) são repartidos conforme a quota de cada pessoa; não é da política cooperativista a acumulação dos lucros, transformando-os em capital imobilizado.

v  Juros limitados ao capital: o capital sempre está em função da pessoa, e não se transforma, como no capitalismo, em produtor de riqueza e gerador de mais lucro por si mesmo.

v  Vendas à vista: não se dá aquele famoso golpe de pegar o produto e pagar no ano seguinte.

v  Neutralidade religiosa, política, social, sexual e racial: todos são irmãos/irmãs, com os mesmos direitos e deveres, com a mesma dignidade.

v  Educação cooperativista: um pequeno fundo é reservado para a educação dos sócios. Desde o início se percebeu que sem uma educação dos sócios, sem formação duma consciência política e social, a exploração de uns sobre os outros se tornaria uma fatalidade.

v  Integração cooperativista: é a cooperação que deve existir não só internamente, mas também entre diversas cooperativas. Se todas tem o mesmo ideal, somente pela união conseguirão valer seus princípios e seus interesses.

As cooperativas no Brasil
É evidente que num modo de produção como o nosso, em que o capitalismo é dominante sofre pressões e mesmo interferências. Essas pressões e interferências se situam em diversos níveis:
No nível jurídico talvez esteja o principal problema. A legislação cooperativista não é feita pelos membros e associados. Quem faz a legislação é um órgão em que o governo nomeia a maioria dos membros. É evidente, pois, que quando uma cooperativa começar a crescer, trazendo problemas para o livre trânsito do capital, os representantes do capital, através do Estado criam empecilhos através de leis que diminuem a eficiência das cooperativas. Enquanto as cooperativas produzem muito, principalmente para exportar, satisfazendo assim a política do estado, elas podem continuar a trabalhar. Isso, afinal, interessa o governo.
No nível político, o Estado interfere nas cooperativas, sempre que necessita delas para sua legitimação ou proveito. Determinados favores são concedidos a certas cooperativas em troca do apoio político de determinados candidatos. Dificilmente uma cooperativa consegue se manter neutra, politicamente falando. A cooperativa se transforma, assim, em mais um campo de ação político-partidária, frustrando sua finalidade e indo contra seus princípios fundamentais de neutralidade política.
Mas a principal interferência do Estado se dá em nível ideológico. São os mecanismos todos do Estado que fazem com que as relações dominantes do modo de produção capitalista se transfigurem também para a prática das cooperativas. Em diversas pesquisas se constatou que entre os sócios duma cooperativa havia distinção entre os que contribuíam com mai produção (ou capital) e os que contribuíam com menos. Isso fazia com que os que contribuíam com mais se julgassem, de certa maneira, donos da cooperativa. Eles se julgavam com direitos de tomar decisões em nome de toda a cooperativa. Assim ideia capitalista, de quem tem mais, manda mais, já se tornou comum entre os sócios das cooperativas. Essa influência das relações dominantes dos sistema é sub-reptícia, legitimando, como consequência, práticas de dominação e exploração.
Na base de tudo, está o grande problema da educação cooperativista. Os sócios não sabem como deveriam ser o funcionamento duma cooperativa e não conhecem seus direitos. O fundo para a educação, que por lei deve ser descontado de toda operação de lucro, não é empregado para seu devido fim. Os cooperativados são, assim, mantidos na ignorância, pois assim podem ser facilmente manipulados.
Em contraposição, uma cooperativa bem orientada e com participação efetiva de todos os sócios pode-se transformar num grande fator de transformação social. E a cooperativa possui ainda uma grande vantagem sobre os demais aparelhos, pois ela conta como base econômica que lhe possibilidade de agir livre e autonomamente no aspecto financeiro, sem depender diretamente do dinheiro, do Estado ou capital. Esse fator transforma a cooperativa numa instituição de grandes possibilidades para forçar alternativas diferentes das permitidas pelo Estado.


O Aparelho Ideológico dos Sindicatos

O que é Sindicato?
O Sindicato  é uma organização livre e autônoma de pessoas com finalidade de defender e promover seus direitos.
O sindicato pode ser uma organização de qualquer tipo de pessoas, onde tanto patrões como empregados tem o direito de se organizar. A principal finalidade, porém, é a defesa dos direitos dessas pessoas e a reivindicação de seus direitos.
O importante de qualquer modo é insistir nas qualidades de um verdadeiro sindicato: o de ser livre e autônomo.
Livre: entra quem quer, sai quem quer.
Autônomo: independente, soberano, podendo discutir em pé de igualdade com qualquer outro sindicato ou organização. Pelo de os sindicatos serem, ou quererem ser autônomos, defenderem o interesse dos trabalhadores, eles os julgam perniciosos, negativos, e chagam assim, a igualar o ser contra o capital ao ser contra a nação. Então quem e contra eles, ou contra o governo criado, mantido e manipulado por eles, é, consequentemente contra a nação.  Dessa maneira, através da educação, e mesmo através da religião (uma religião que eles usam como arma ideológica para manter as pessoas obedientes e quietas), eles tentam igualar a ação do sindicato como sendo uma ação desordeira como sendo violenta, de gente que não aceita nada, que é sempre contra.
As "pessoas de bem", as "pessoas religiosas", as "pessoas boazinhas" não devem se meter com desordeiros e arruaceiros que só fazem greve e prejudicam a ordem estabelecida.
É evidente que o sindicato sempre deve estar a serviço do bem comum. Se ele não estivesse a serviço do bem comum, mas procurasse apenas promover e ajudar um grupo, em prejuízo evidente dos outros grupos ou em prejuízo evidente da nação como um todo, nesse caso, sim, o sindicato estaria explorando seus direitos.
Os sindicatos devem procurar o bem comum, a justiça. E é uma pena que grande parte das vezes não consiga chegar a solucionar os problemas pacificamente, através de conversações, mas é necessário chegar a ações mais drásticas e duras, como manifestações e greves. Se a causa é justa, a greve é justa, caso não haja outro meio de solução.

O sindicato no Brasil
As relações fundamentais, básicas, essenciais, existentes dentro da nossa sociedade são:
  • Dominação: Alguns são "donos" dos meios de produção, que produz riqueza. Sendo donos das coisas acabam sendo donos das pessoas, pois no momento em que uma pessoa necessita trabalhar para viver, ela vai necessitar dum meio de produção, e sendo que os meios de produção estão nas mãos de alguns, o trabalhador está dependente do que possuem os meios para poder sobreviver.  A dominação passa, pois a ser também uma dominação política e social.
  • Exploração: "O trabalho é a fonte única das riquezas" (Leão XIII). Os donos do capital se enriquecem na medida em que se apropriam de parte da força de trabalho dos trabalhadores: a única coisa que pode ser explorada é o trabalho humano, pois só ele produz riqueza.
Essas relações vão estabelecer um sistema de classes.
Não são os trabalhadores que criaram ou que desejam as classes sociais. as classes sociais, o capital e o trabalho, foram criados fundamentalmente pelos donos dos meios de produção no momento em que eles se apropriaram.
A partir dessa realidade concreta de classes que se deve compreender e discutir o sindicato.
Numa sociedade de classes, a classe dominante apodera-se do aparelho de Estado para colocá-lo a seu serviço. Numa sociedade de classes, o Estado é a classe dominante, e pode ser que dentro da própria classe existam facções de classe, e uma facção domina sobre a outra. Mas quando a contradição fundamental se mostra (a contradição capital-trabalho), os donos dos meios de produção (capital), mesmo divididos em facções para dominar o aparelho de estado, formam imediatamente uma aliança para garantir o poder.

A questão do sindicato

Quando se diz que o sindicato não é livre nem autônomo quer se dizer que o sindicato (o sindicato dos trabalhadores) não está sob o domínio real dos trabalhadores, mas sim de pessoas ligadas ao capital. E eles não largam mão de maneira nenhuma desse aparelho, pois é decisivo de todos. isso se torna claro, pois o sindicato é a organização dos trabalhadores a partir do trabalho, e o trabalho é tanto "a chave da questão social", no dizer de João Paulo II, como também é a "chave de solução da questão social". Pois se é o trabalho que faz tudo, produz toda a riqueza, no momento em que os que trabalham puderem ser autônomos  e donos de sua produção, eles conseguirão sua liberdade. Por isso o estado  pode largar mão de tudo, menos do controle do trabalhador.
Nos inícios de nosso século chegaram a existir organizações de trabalhadores e sindicatos que realmente eram autônomos e chegaram a modificar em parte a estrutura social. Mas a partir de 1930, com Getúlio Vargas, o sindicato é finalmente atrelado ao Estado e somente em 1988, com a nova constituição, a legislação foi modificada, alterando assim, o seu real valor e objetivo. 
Diante disso começou-se a discutir o que deve ser um sindicato, e começou-se mostrar as falhas e ideologias de um sindicalismo oficial e espúrio. Se a Nova Constituição conseguiu resgatar boa parte do que deveria ser um sindicato, isso não significa que a luta para que se tenha um sindicato verdadeiro e autêntico tenha terminado. O trabalho é a "chave da questão social", e a questão social não é algo que possa ser definitivamente solucionado, pois é ai que residem as contradições fundamentais, as quais são:
  1. Muitos dos grupos que se dizem sindicados, ainda se ressentem de um comportamento adulterado ao se transformarem e atuarem à maneira de entidades assistenciais esquecendo sua função primeira e fundamental que é defender os interesses dos associados, acomodando-se e visando conseguir algum bem-estar imediato e em geral material. Outra questão discutida é a ligação desses sindicatos a partidos políticos, o que se torna um comportamento errado, pois o poder legislativo vai trabalhar para que as leis implantem ou implementem políticas, já os sindicatos são grupos dos quais participam apenas determinadas pessoas ligadas a uma atividade específica.
  2. Exige-se ainda a organização da luta dos sindicatos a nível mais amplo, que é a existência sindicais dentro de um país e que estes se estabeleçam internacionalmente, ligando-se uns aos outros, ou sejam, que os sindicatos possuindo ligações nacionais, também possam manter suas forças em termos mundiais.
É fundamental que o sindicatos e todas as associações que a ele se assemelham, continuem sua luta para cumprir sua finalidade fundamental: a construção da solidariedade, pois é somente na união e na organização que os grupos organizados poderão garantir seus direitos e restabelecer relações de justiça e igualdade.e

O Aparelho Ideológico das Igrejas

Muitas pessoas podem estranhar que as igrejas possam ser um aparelho ideológico a serviço da reprodução das relações de dominação, no caso, do sistema capitalista.
A crítica sociológica da religião ajuda a própria igreja a purificar-se, a questionar-se de capas e cargas históricas que a deixam deformadas e absoletas, pois as pessoas desse meio existem num contexto sócio-histórico. Na verdade o que se vê são pessoas que buscam as igrejas para melhorarem de vida ou se manter num poder e não pela fé.
Ao longo do tempo os poderosos usaram a igreja para maltratar seus colaboradores se colocando como DEUS. Pois toda pessoa que se coloca ao contrário eles chamam de ateu, pois muitos morreram e mataram por causa do cristianismo. Eles esquecem  da ação concreta que se eles estão servindo a Deus ou ao poderio de tudo isso, não estão eles servindo aos interesses do grupo do poder e transformando-se em instrumentos ideológicos para legitimação perpétua desse grupo.
Tentam-se distinguir dois tipos de religião pelo fato de ser usada e instrumentalizada por diferentes grupos, possibilitando a fácil análise crítica dos diversos grupos religiosos que vão surgindo dia-a-dia em nossa sociedade brasileira.
  1. A religião como superestrutura: A religião é superestruturada quando se torna um conjunto de mediações simbólicas e gestos rituais, quando se torna doutrina explicativa do mundo, a serviço de nações e impérios. Essa religião superestrutural não precisa ser apenas de imperadores e reis. Ela pode existir dentro das próprias instituições que de dizem religiosas.
  2. A religião infra-estrutural: a essência desta é o reconhecimento da relatividade das coisas, do criado. Ela não se situa na instância ideológica, mas é posição, atitude, práxis. Ela é ´"atéia" de um sistema que se diz divino, ela não aceita um deus terreno, um poder absoluto. Ela desmistifica e relativiza os impérios e os ditadores.
Como se pode ver através da história, esses dois tipos de religião sempre estiveram presentes. Ao lado da religião do poder, coloca-se a religião da libertação.